sábado, 28 de fevereiro de 2009

Relato de Parto em Casa (publicado originalmente em setembro de 2006)

Volto a postar o relato de parto da Dora, pois tive problemas com o blogger e perdi muitos textos.

Fabi, essa é pra dar força para vocês, na chegada da Laura.

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"Só para lembrar: não existe criança grande demais que não permita parto normal. Parto normal não é causador de problemas para mãe nem para o bebê.
O mesmo vale para a cruel episiotomia. Médicos (as) cortam mulheres para facilitar o próprio trabalho e não para beneficiar mãe e bebê.

Evidentemente, existem situações extremas na qual o parto forçado (cesárea) é útil, mas não faz sentido caso o bebê tenha sido monitorado ao longo de toda a gravidez e tiver apresentado boa saúde.

Curiosamente, a maior parte dos médicos que sugerem o procedimento apontam para as mães supostos problemas de última hora. Até alegar o que o bebê tem unhas grandes ou está bebendo xixi na bolsa é dito as mães, como se isso não fosse algo normal. Tem também a máfia da "bolsa rompida". Gente, o bebê e a mãe podem ficar até 12 horas em trabalho de parto após o rompimento da bolsa, sem risco nenhum.


Com nossa primeira filha fomos ingênuos e acreditamos que mesmo com uma equipe de cirurgião plástico e anestesista a postos, o médico faria uma parto normal. Fomos enganados. Assisti ao parto, por exigência da Dani e cortei o cordão umbilical. Sacanamente, o médico me disse a mentira mais comum nessa hora "Viu, o cordão estava enrolado no pescoço". Minutos depois do parto, me chamou num canto e pediu os acertos para os auxiliares. O dele poderíamos acertar depois. Um pai nessa hora, emocionado e louco para ficar perto da mulher e do filho faz qualquer coisa. E os médicos sabem disso. Triste. Muito triste.

Em janeiro de 2006, o nascimento da Dora, nossa segunda filha, foi em casa, em paz, sem luzes feéricas ou o clima artificial de hotel cinco estrelas da Maternidade Perinatal, em Laranjeiras, no Rio de Janeiro, onde nasceu nossa filha mais velha.

É uma pena que a medicalização do parto tenha resultado numa certa inversão de valores.

Os planos de saúde reembolsam R$ 400 por parto para os médicos, não importando se é cesárea ou normal.

Vocês acham que os médicos vão escolher o quê?

Ficar horas (a maioria nem leva tanto tempo) esperando o expulsivo ou marcar hora para poder triplicar seus rendimentos por dia (um obstetra faz em média três cesáreas com hora marcada por dia).

Assim, a maioria da cesáreas ocorre em pacientes de classe média alta, nos planos superiores dos seguros de saúde. Justamente aqueles que pagam as internações em maternidades luxuosas...

Mas com o tempo e mais informação disponível, os pais poderão questionar mais os médicos durante o pré-natal, inclusive pedindo os prontuários de acompanhamento médico que justifiquem uma cesárea.

Nós decidimos que o nascimento de Dora seria em casa. No finalzinho da gravidez começamos a freqüentar o GAMA, um grupo de mulheres e mães, algumas profissionais da área da saúde, dedicadas a ensinar a mulher a resgatar o próprio corpo. Um trabalho belíssimo que merece todo o apoio que for possível dar. Nos encontros, outras mães e pais relatavam suas experiências com partos humanizados. Bonito de ouvir e bacana ver as pessoas se ajudando numa cidade gigante como São Paulo. Uma das questões que afligiam os casais era o fato dos planos de saúde não bancarem partos domiciliares. Para estes casos, a melhor opção é fazer uma poupança, assegurando os valores para cobrir os custos.

O médico escolhido por Dani providenciou toda a informação para que pudéssemos nos preparar para a chegada do bebê em casa. Detalhou o procedimento, indicou os exercícios e nos explicou a importância do plano de parto.

Barriga crescendo, os meses passando e muita gente surpresa ao descobrir nossa escolha. As pessoas imaginam um parto em casa como as cenas do antigo seriado Daniel Boone, com tinas de água fumegante, e tocos de madeira para morder (se bem que estes são substituídos pelos pobres braços da doulas na hora da dor).

Para quem não sabe, o parto domiciliar é feito com acompanhamento do obstetra, que trás os equipamentos necessários em caso de emergência. Também é feito um plano de parto, para que possa ser feita uma remoção para um hospital em caso extremo de risco de morte para o bebê e parturiente (o que é raríssimo).

O procedimento em algumas ocasiões é realizado por parteiras. Infelizmente cada vez menos mulheres abraçam essa ocupação tão bonita, que já ajudou a vir ao mundo tanta gente bacana.

É bom ter uma doula para o acompanhamento das necessidades da parturiente. Ajuda pra caramba, das massagens ao chazinho na hora difícil. Encoraja e ampara, num estilo "Lojas Marisa" (de mulher, pra mulher...Marisa, lembram?) deixando os maridos plenos para prover suporte emocional. Gosto de lembrar que doulas não fazem intervenções médicas, mas se um "bebê quiabo" chegar, daqueles que saem sem dor, elas podem segurar.

Em casa basta ter um espaço tranqüilo, arejado, asseado e repleto de amor.


Os futuros pais ficariam assustadas com os índices de infecção hospitalar nas maternidades. Nem mesmo as conceituadas escapam. Falarei sobre isso em outra ocasião. Em casa não existe risco de infecção hospitalar.

Iniciado o trabalho de parto, estar em casa faz com que a mulher fique mais tranqüila, pois não é preciso alterar a rotina e você estará no ambiente que mais gosta, que ajudou a criar. Para não assustar os amados pais com nossa decisão, Dani manteve segredo e importou uma tia do Rio. Sua presença ajudou a trazer tranqüilidade nas horas difíceis. E foram muitas, longas e exaustivas. Repletas de dor.

A vibe de estar entre os queridos também é boa demais. No hospital são tantos partos por dia que é impossível existir uma completa entrega das pessoas que trabalham ali. Tudo é pasteurizado e automático. A competência existe, mas falta carinho e atenção.

Em tempo: nada de toalhas quentes, como assistimos nos filmes. Precisa é de chuveiro bom, pois as dores são fortes pra cacete e não dá para a mulher não gritar. Ah, é bom avisar os vizinhos, se for morar em prédio. Nós esquecemos de avisar, daí já imaginou as especulações sobre a gritaria intermitente madrugada adentro...

Voltando: na madrugada do dia 14 para o dia 15, a bolsa estourou. Bebê mesmo, somente as cinco da manhã do dia 16 de fevereiro de 2006. Na manhã do dia 15 fomos a um hospital fazer a última cardiotoco (mede os batimentos do bebê e atesta que está tudo tranquilo, mesmo com a bolsa rompida), e as enfermeiras não acreditando que o parto seria em casa, desdenhavam, dizendo que Dani deveria ficar internada. Só uma das enfermeiras, uma simpática chilena fã de nosso médico, entendeu a beleza daquele momento.

O expulsivo é rápido e emocionante, mas esteticamente pode assustar alguns. Minha filha, na época com quatro anos, acordou as 4:00 da manhã para assistir tudo. Curtiu pra caramba. Parecia que ela tinha acabado de nascer também, pois estava peladinha, segurando o relógio para marcar a hora do nascimento da irmã.

A futura mãe usa um banquinho para ajudar na expulsão, ficando apoiada de cócoras. Muito mais fácil para sair o bebê. Dani não quis ver a cabecinha saindo. Eu vi.

No hospital te obrigam a ficar deitada, mesmo com muita dor. Nos momentos finais do parto, dificilmente um hospital ou maternidade deixa as pessoas mais queridas ficarem próximas. Algumas maternidades já possuem salas de parto, pagas a parte, onde é possível fazer procedimentos semelhantes.

Em casa outros recursos, como caminhar abraçado em movimentos de quadril ou usar a bola suíça ajudam pra caramba e tirando as contrações, podem ajudar a descontrair.

Rola muito sangue, por isso usamos lençóis descartáveis e é bom forrar o colchão com algo impermeável. Na correria, quando a bolsa estourou eu forrei a cama toda com o conteúdo do primeiro pacote que encontrei. Eram fraldas para o bebê.

Não precisa aspirar nada. O próprio aperto do expulsivo prepara os pulmõeszinhos para receber as primeiras doses ar atmosférico da vida do bebê e tira o muco que veio da vida uterina. É tudo automático e programado em nosso código genético. Quanto menos interferência, melhor.

Após o nascimento (e depois do mais uma vez eu cortar o cordão umbilical) o bebê foi logo para a mãe. Começa a mamar e fica ali, sujinho, bem ao lado dela. Amamentar é importante pois contrai o útero, facilitando a saída da placenta, que é removida completamente com ajuda do médico. Ele guarda o material para análise de laboratório.

Só te digo que chorei pra caramba, é emocionante demais. É ver a vida chegar num ambiente de paz, sem a mercantilização do nascimento. O choro, a respiração...Nossa, nem sei contar, só vendo.

Dani ficou bem fraca com a perda de sangue e o esforço, chegou a virar o olho. Me assustei, liguei para o médico e a doula, mas fui tranquilizado. No dia seguinte ela estava nova.

Se quiser, pode chamar um pediatra, mas não é necessário. Ele pode ver o bebê no dia seguinte.
É bom para quem é iniciante, pois é a hora de aprender a limpar o bebê, e entender as primeiras reações.

O médico deixará com você uma guia para ser preenchida e levada ao cartório atestando que o bebê nasceu de parto domiciliar assistido. Tive dificuldades para registrar, pois a indústria da medicalização do parto atrapalhou até nisso. No momento mais bonito da sua vida, suspeitam que você seqüestrou o recém-nascido. Tive que brigar. Nas maternidades montam até filiais de cartórios para registro.

Pesando tudo, planejar um parto domiciliar é fantástico. Uma família unida em torno de uma idéia, de um direito de minha mulher. A pequena Dora está uma bagunceira saudável, como vocês acompanham no blog e eu sou um cara realizado por ter ajudado minha mulher a vencer a barreira fictícia da impossibilidade do parto normal.

O importante é deixar registrado que mesmo uma mulher que tenha feito uma cesárea pode tentar o parto natural numa segunda gestação.


Quem faz o parto não é o médico. É a mulher. O parto é dela e todas as suas sensações e pedidos devem ser respeitados nessa hora. O hospital roubou da mulher o
direito a ter controle e decisões sobre o final da sua gestação. Daí hoje sabermos (ou sentirmos) tão pouco o que acontece dentro das nossas amadas.

Sei que faltou alguma coisa, não consigo lembrar de tudo. Assim, me autorizo a alterar este post se lembrar de mais detalhes."

Bons ouvidos

Bom gosto musical vem de berço: minha irmã agora no Gtalk, ouvindo The Kinks.

MInhas filhas tem curtido Ramones, Rancid e momentos de música clássica. E o amigo favorito da minha filha mais velha é louco por violino e piano. Boa parte da manhã de sábado é dedicada por ele a lapidação desse bom gosto.

Lia chegou a estudar violão na escola, mas deu uma parada. Quem sabe o fenômeno Mallu Magalhães não venha a inspirá-la...

Mas torço para ela ser menos pretensiosa e cantar melhor.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O retorno


Lia está com quase oito anos. Dora cruzou a barreira dos três. Inteligentes, questionadoras e sensíveis.

Imagine essa dupla sem escola, quase no final de fevereiro. Loucura em casa.

É que estamos voltando para o Rio de Janeiro. E, antes de sabermos exatamente o novo endereço, nada de selecionar o estabelecimento que vai receber nosssas meninas.

Dessa vez, para evitar os tropeços financeiros dos outros anos, vamos tentar pagar seis meses antecipados, caso as duas venham a estudar em escolas particulares.

Tenho me tornado favorável ao ensino público. O principal motivo é a carência de qualidade pedagógica em muitas escolas particulares, com currículos defasados e pasteurizados.

Virou moda "comprar" conteúdo programático de grandes grupos educacionais, quase como uma franquia.

O professor, munido de material padrão, obviamente fica menos estimulado a desafiar o processo cognitivo da molecada e acabam colaborando para formar uma geração de robôs voltados para o vestibular.

Outro incomodo frequente nas escolas particulares é a febre de consumo da classe média, personificada nos bens de consumos portados pelos pequenos.

Celular, MP3, video-game portátil, câmeras digitais. Não sou cotra nada disso. Mas o jogo do "eu tenho, você não tem" está cada vez mais precoce.

Na escola pública o próprio perfil sócio-cultural de alunos e pais se encarrega de corrigir certas distorções consumistas.

Efeito colaterais? Apenas a exarcebação do medo que temos do outro, do diferente, do supostamente pobre e sem formação intelectual-cultural.

É claro que não vou colocar minhas filhas em uma escola pública sem condições adequadas. Instalações, professores e alunos devem ser avaliados. Mas não demonizados.

E cá entre nós, sexo precoce, violência, funk e axé são coisas que nossas filhas enfrentam mesmo estudando em tradicionais escolas de elite.

E como...

Vamos lembrar que aqueles que criam pérolas como o big brother e outros produtos dessa natureza foram formados nas melhores escolas particulares do Brasil...

Veremos como o Rio de Janeiro vai nos receber...

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

2009?

mudou alguma coisa?

os mesmos acidentes aéreos. a mesma violência contra mulheres. o mesmo nível abissal dos profissionais da grande imprensa.

o mesmo culto ao presidente pop star americano, o qual acaba de pedir mais U$200 milhões para ampliar a guerra no afeganistão.

o mesmo silêncio coletivo em relação ao que realmente importa.

sendo assim, o que devo conversar com minhas filhas?

decidi que elas precisam aprender como evitar virar "povo-gado", que não consegue ter consciência crítica.

cedo?

não. cidadania e ética precisam ser tão corriqueiras como beber água.

é, tenho trabalho duro pela frente.