amo. foto: Felipe B, 2010.
O assunto veio à tona em comentário sobre os
mitos da amamentação no blog da amiga Zel. Pensar fora da caixa faz muita gente ficar fora do eixo e esquecer de colocar em foco assuntos importantes na vida conjugal.
Tendo passado por esse processo duas vezes, com reações e aprendizados diferentes em cada ocasião, acredito que cabe iniciar uma reflexão a respeito (no pun intended).
Com exclusão dos casais homossexuais masculinos (que não enfrentam os dilemas do pós parto e amamentação, seja em barrigas de aluguel, seja em adoção), todas as outras combinações conjugais passam pelos dissabores da posse do bico do seio.
Mais do que sabido é o fato das mudanças hormonais provocarem modificações físicas e emocionais importantes. Em muitos casos, nem a penetração pode ser cogitada, tal o estado de ∂úvida ao qual o corpo é submetido. A quem ele pertence? Ao bebê? Ao pai? A escrutínio alheio?
"Esse corpo, esse peito, essa buceta são meus, mulher e mãe! Devolva-me!", gostaria de vê-las gritar.
Mas não é fácil. Sabemos que não.
Naturalmente, devemos leva-las em consideração. Mas existem aspectos culturais que estão profundamente enraizados e que fazem homens e mulheres perpetuarem mitos, mesmo que não queiram.
Quando a mulher recusa acesso ao bico do peito de forma erótica existem desculpas prontas para não faze-lo: higiene, dor, falta de sensibilidade, dedicação total ao rebento, nojo. Muitos cônjuges, homens e mulheres (no caso de casais lésbicos), notadamente os mais jovens, tendem a introjetar conceitos semelhantes: se deixam levar pelas alterações físicas de cor e forma para justificar sua aversão ao toque, seja com a boca, seja com as mãos, pênis ou vagina.
Grande parte daquela erotização do casal, que levou à gestação ou ao pacto entre duas mulheres de recorrer a inseminação artificial acaba perdida em meio a pensamentos antiquados e preconceituosos.
E a parte fêmea dessa equação acaba sendo penalizada. Primeiro, por não ter a clareza de como ou quando deseja retomar o uso do próprio corpo e não considerar essa discussão algo pertinente a casal. Por outro lado, alguns cônjuges vão se deparar com situações atípicas na sexualidade pré gestação.
Casais que tiveram vida sexual ativa até o parto, mesmo com lactação precoce, podem ter soluções divertidas e interessantes para compartilharem. Mas e o tabu de conversar sobre sexo? Sobre vida feliz? Sobre prazer? Como tem gente que enxerga na barriga dilatada fantasmas que coibem o desejo.
Pode ser que nem queiram saber o quanto e como você gozou durante a gravidez. Pena.
Algumas mulheres ficam menos sensíveis e desenvolvem o gosto por toques mais vigorosos, que estimulem de forma mais intensa os mamilos. Até a nova forma dos mesmos ajuda a construir uma nova personificação erótica, que pode ficar submetida a um rigor moral. Aquele fantasminha da vergonha de ser classificado como curtidor de BDSM fica rondando...
Se conversar sobre toques no grelo e outros aspectos da sexualidade ainda são tabu para alguns casais mesmo antes da gestação, imagine o choque de alguns parceiros(as) ao perceberem suas mulheres interessadas em uma nova forma de usar o corpo, fora dos padrões aos quais estavam acostumados.
Sim, existe prazer na relação com a dor. Nem todas ficam mais sensíveis e rejeitam o toque. Aquelas que o fazem, talvez estejam querendo outra forma de interação, de troca, de estímulos. Se a dor e sensibilidade extra as incomodam, precisam ser respeitadas, ouvidas em sues desejos -alguns insuspeitos- e não desestimuladas aos jogos eróticos.
Acusar o outro de sabotador no auge da sensibilidade não parece ser uma medida inteligente sob nenhum aspecto, tendo em vista a busca por uma família harmônica.
É preciso entender que existem mulheres que desligam o modo “erótico” dos seis por uma questão de praticidade. O caso de amamentar em público é um desses. Se a noção coletiva de respeito ao “estado” da lactante parece ser senso comum, no íntimo sabemos que existem muitos homens e mulheres que apreciam uma mama cheia, com mamilos proeminentes, túrgida, bela em suas formas ampliadas. E nem todos (as) conseguem desviar o olhar. Se a mãe não se sente confortável com isso, é natural que crie defesas. É um direito dela.
Outra distorção moderna que pode atrapalhar de forma cruel é o mito da estética do peito. Motivada pelas imagens de celebridades cujo os peitos nunca caem, existem moças que logo ao pararem de amamentar entram na paranóia de clarear os bicos de forma artificial ou fazer cirurgia estética das mamas. Pressão de mães, amigas (?), de maridos e “maridas” (sim, leitora, no mundo das moças, alguns arquétipos também estão presentes, e de forma bem intensa e conservadora) para que se chegue ao que o outro considera o corpo “ideal”.
Perde-se a essência de vivenciar o corpo da parceira transformado pela geração de vida. Busca-se desesperadamente o “estágio anterior” da relação através da retomada do corpo antigo. Se não um erro em sua essência, tal comportamento mergulha no tanque dos equívocos.
A mulher é soberana para decidir sobre o destino e o uso de seu corpo. Mas não deve ficar soterrada sob teorias e conceitos arcaicos, que em nada ajudarão na relação dela com o filho ou parceiro(a).
Que fique claro desde cedo que “mamãe goza e quer ser feliz”. E se tiver que usar o peito “sagrado” para isso, logo, durante a amamentação, que assim seja.
Seja feliz com seus bicos.