sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Faz um 21...

Uma leitora de 21 anos me pergunta o que fazer para reaproximar-se do pai. Eu não sei. Não confiou em terapeutas e suas "linhas", portanto não vou emular um e dar respostas fáceis. Não sei como foi a mecânica dessa relação que em em pouco tempo fez da magia da paternidade um abismo entre esse pai e essa moça.

O que sei é que tenho medo. Muito medo. Medo de fazer tudo certo e minhas filhas acharem que fiz tudo errado. Mas não abro mão da linha que tracei, de não fazer concessões desnecessárias, de não abreviar a infância e de ter o caminho do diálogo aberto desde já.

Vai funcionar? Não tenho como afirmar. Eu posso morrer antes dela chegar na idade "de dar problemas". O pepino ficaria para a mãe. Mas pode ser que eu possa ter nela uma grande companheira de surf, de livros, de descobertas. Pode ser que eu seja um "colo" para sempre, para todas as roubadas da vida, um porto seguro depois de cada toco ou frustração. Um porto seguro nos momentos felizes, de vitória, de conquista, de realização pessoal.

Eu poderia dizer à leitora para chamar o pai para conversar, expor seus anseios e, sim, pedir o seu colo. Mas não farei. Tenho visto coisas, diariamente, que me fazem duvidar de certas paternidades.

Alguém consegue explicar um pai chutando a cabeça de sua filha de 15 anos até a morte, apenas por ela estar namorando na praça, escondida? Brasil, 22 de novembro de 2010. Foi preso. Já soltaram. A igreja dele não permitia o namoro. Aos 41, já não tenho muita paciência com humanismos politicamente corretos. Cansei deles. Eu mataria esse homem se pudesse, da mesma maneira que ele matou a menina.

Sou devoto da paternidade responsável, mas sei que a vida não é linear. Altos e baixos acontecem. Mas, se decidimos ter filhos, temos a obrigação de zelarmos pelas crias. Obrigação! Não é opcional. Ninguém pediu para nascer. Nós trouxemos essas pessoas para cá. Sendo assim, antes de qualquer merda acontecer em nossas vidas temos que zelar pelo bem estar de nossas crias. Ainda mais meninas, que já crescem sob um manto de submissão, controladas em sua essência para comportarem-se como a sociedade quer e não como elas mesmas são.

De que adianta comemorar um dia de Não Violência Contra a Mulher em um mundo repleto de Valeskas Popozudas, Mulheres Melancia, Sabrinas e afins? Respondo: nada! Enquanto as mulheres decidirem se auto-agredir em sua essência, pouco vai melhorar a maneira como as identidades masculinas em formação enxergam a figura da mulher. Se uma mulher ganha dinheiro e divulga sua imagem pública chamando-se de buraco e a maior parte de seus seguidores são outras mulheres, algumas prestes a serem mães, sabemos que a luta pelo respeito e igualdade não vai terminar tão cedo.

É preciso mostrar para essas meninas, desde cedo, que elas vivem um uma sociedade supostamente igualitárias, gerida pelo "livre arbítrio", mas que muito da liberdade propagada é moldada pela visão e mundo dos homens. Moldada na construção delas como objetos de desejo. Peças de consumo.

É preciso educar essas meninas para que não tenham conflitos precoces entre suas práticas e ideias da vida privada com a postura que se espera delas na esfera publica. Se minha filha gosta de masturbar-se com pensamentos submissos ela precisa saber que não precisa viver com culpa ao ter que adotar uma postura diferente na vida social, acadêmica e profissional.

Tirar a culpa da cabeça da mulher, ou dar espaço para que elas verbalizem suas confusões desde cedo pode criar mulheres mais fortes, menos sucetíveis aos caprichos masculinos mais nefastos, que ainda fazem vítimas diárias nas mais diversas classes sociais e modos de vida.

Eu, você, todos nós conhecemos uma mulher que apanha (fora dos limites da sexualidade, como falei acima -a velha discussão do sexo violento consentido entre adultos- eu gosto) de marido, de amante, de namorada (sim, lésbicas, as vezes, não se respeitam como mulheres - vão tapar o sol com a peneira?) e permanecem caladas por anos a fio. Pelas crianças, pelo casamento, "mas eu não tenho para onde ir", "o que meus subordinados vão pensar". E assim, a essência do feminino continua sendo jogada no lixo. Pelas próprias mulheres.

A leitora que disparou o post, desejo toda a coragem para descobrir o ponto de convergência entre ela e o pai. Torço para que tenham algo em comum que possa ser explorada na retomada de uma relação cordial. Mas se perceber que é tarde demais, faça o foco em seus objetivos de vida e siga adiante. Sua vida vale mais do que tudo.

2 comentários:

  1. adoro seus postings

    e concordo 100% com o que vc disse

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  2. Obrigado pelo comentário. Ser pai de menina não é mole. Discutir como melhorar essa relação, mais difícil ainda. Um beijo.

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