segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Filhos não precisam de privacidade digital. Nós precisamos de olhos abertos.

Mais uma semana e mais um caso de meninas adolescentes que partem para encontros com desconhecidos combinados via internet, dessa vez na Bahia e no Paraná. Seja em salas de chat, seja por redes sociais, seja por mensagens instantâneas (MSN e afins) a molecada está na alça de mira de sacanas de todo o tipo. Muitas vezes amigos da família. Muitas vezes, familiares. Se bancarmos os modernos e fizermos vista grossa à vida digital de nossos filhos vai dar merda, claro.

Tudo por que essa geração de crianças é cria direta de pais usuários de internet que dão pouca ou nenhuma atenção ao fato de que, sim, existe gente que sabe da vulnerabilidade de uma pessoa em formação diante de uma liberdade total de expressão. E a equação é simples: uma criança ou adolescente que passe mais de 2 hors diárias em frente ao computador ou dispositivo portátil trocando mensagens ou consumindo (sim, consumindo - a maioria não produz conteúdo relevante.) é devido a uma carência de atenção paternal.

Não existe rede social apra crianças. Aliás, nenhuma delas coloca em seus disclaimers que assume a responsabilidade de serem babeas do que seus filhos fazem na rede. Criança não precisa de celular. Criança não precisa de comunicador instantâneo. Mas a ansiedade paternal de querer ver o filho inserido na modernidade -um must nas conversas de pais que gostam de exaltar os "superpoderes" dos filhos- está expondo nossas crianças e adolescentes cada vez mais aos impulsos nefastos de predadores sexuais habilidosos em identificar fraquezas, apostando em um misto de curiosidade, impulsividade e carência de afeto e atenção típicos dos pais de nossos tempos.

A coisa piora quando entra em jogo o conceito de privacidade. Primeiro, crianças não devem ter privacidade em sua comunicação com estranhos, sejam eles de que idade forem. Os controles parentais disponíveis em toda e qualquer ferramenta de comunicação digital, incluindo ai os videogames com acesso à rede, estão lea para serem usados. Não são enfeites.

Precisamos, sim verificar os logs de mensagens e saber quais sites nossos filhos frequentam e que tipo de conteúdo estão tendo contato. São influências, boas ou ruins, mas que possuem um canal direto para as cabeças da garotada, sem filtros. Compre, tenha, seja mais do que o outro. seja sexy. seja superior. Como diz Washington Olivetto na coluna de Daniel Castro na Folha de São Paulo publicada em 22 de novembro de 2010, "É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade".

Se levarmos em conta que os principios que aprendemos em publicidade para seduzir e criar consumidores cegos, com corpos dóceis e vontades manipuláveis, podem e são portados para as relações humanas, fica claro que o cenário de vulnerabilidade de nossos filhos é real e vasto. Nossa obrigação é prepará-los para separarem o joio do trigo.

Quando um predador sexual, homem ou mulher, chega próximo à fragilidade emocional de nossos filhos a ponto de faze-los burlar nossa vigilância e confiança (quando existem) para aventuras que, via de regra, se traduzem em situações trágicas para as crianças é por que não cumprimos nosso papel de protetores como deveríamos. Sem desculpas.

A perigosa inversão de valores, demonstrada pela prática de deixar às crianças o duvidoso posto de capitães da tecnologia em casa ("nem sei ligar, não tenho paciência para isso, mas Fulaninho sabe tudo de informática"), como se isso fosse trazer algum benefício para suas formações sócio-psíquicas-, agrava esta situação de exposição aos perigos, não só para as crianças, como para todo o núcleo familiar.

Uma criança ou um adolescente magoado e complexado em busca de reconhecimento em seu grupo social pode facilmente revelar detalhes da rotina e do patrimônio familiar de forma a alertar meliantes de todo o tipo para ações nefastas. Quando produzi o documentário SEQUESTRO, tive depoimentos de vários sequestradores que procuravam suas vítimas em redes sociais. Na maioria dos casos, adolescentes exibicionistas.

Sem alarmismo, mas com os pés no chão, vale pensar em com a prática da liberdade digital em casa deve ser pensada em um cenário como o de hoje.Uma conversa franca sobre limites, que pode ser benéfica ao expor os assuntos que passam pela cabeça dos filhos, mas raramente tornam-se pautas de conversas familiares.

Nossas experiências online boas e ruins no campo social, erótico-afetivo e profissional devem ser analisadas e delas podemos tirar uma boa conclusão do que podemos proporcionar aos nossos filhos em termos de segurança e responsabilidade com as informações pessoais.

Uso a web e outros meios digitais para todo tipo de relacionamento desde 1994. Tive muitos blind dates onde eu era o sedutor, aquele que proporcionaria a experiência extraordinária, que não poderia ser evitada sob pena de arrependimento eterno. Menti para muitas mulheres apenas para ter prazer imediato, para servir ao meu desejo de conquista. E ter como alvo pessoas incapazes de discernir entre o adequado ou não, independentemente de formação acadêmica ou sócio-cultural era a coisa mais simples do mundo. Na época não havia defesa. Essas pessoas poderiam ser vítimas por carta. Mas eram mulheres adultas e eu não era um bandido sociopata. Mal menor.

Hoje já sabemos como identificar e desestimular os perpetradores de engenharia social com fins duvidosos.

Agora é hora de ensinarmos aos nossos filhos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diga o que quiser. Sempre. Se possível, pense antes de escrever.