41 graus em sala do Colégio Pedro II, em São Cristovão, 21/2/2011 foto: Paulo Alvadia, Ag O Dia.
Quando voltamos para Rio, em 2009, minha filha mais velha estudou em uma excelente escola pública, cuidada com muito carinho pela direção do estabelecimento. Apesar da incrível professora Márcia, um exemplo de dedicação, existiam duas condições que tornavam a tarefa de facilitadora do aprendizado quase impossível: o calor insuportável e o descaso dos pais com a continuidade da educação no ambiente doméstico.
Para o calor, não existe fórmula mágica. Com o que se gasta para comprar e abastecer os carros dos parlamentares estaduais seriam possível instalar unidades de condicionamento de ar em todas as escolas da rede pública, municipais e estaduais. Se incluirmos as verbas de publicidade, seria possível refrigerar até as bibliotecas. Mas nem os colégios federais instalados no Rio de Janeiro, como o Pedro II possuem o equipamento para o corpo discente, instalando-os apenas nas salas da diretoria. Me mostre um lugar no planeta Terra no qual alunos consigam estudar sem perder a atenção sob um calor de 41 graus e ainda assim conseguirem excelência acadêmica e eu paro de reclamar.
O segundo problema é mais grave. Convivi com muitos pais que, quando muito, apareciam nas reuniões da escola para reclamar da rigidez na avaliação das crianças (a professora não concordava com o regime de aprovação automática, que formou uma horda de analfabetos funcionais) e com a exigência do trabalho de casa e da leitura semanal de livros.
Uma das crianças que era de convivência mais próxima relatava as pressões que sofria em casa par largar os livros, que eram "bobagem". Esse menino, inteligente e perspicaz era incentivado por seu pai, zelador de um prédio na vizinhança, a jogar video game (sim, tinha um PS2) e frequentar Lan Houses para usar o Orkut e MSN, mas não gostava que o menino dedicasse tempo para ler. O menino tem agora 9 anos.
O motivo desse comportamento era o fato do pai ser analfabeto e acreditar que um filho "letrado" questionasse seu poder de pai. A mesma história repetia-se em toda a escola, sendo ainda mais cruel com o elemento feminino. As meninas que não se enquadravam no comportamento lascivo precoce, estimulado pela cultura do funk (as "novinhas" que citei em um post anterior), eram sumariamente excluídas do convivio com as demais. Sem maquiagem carregada, pulseirinha do sexo e roupinha cravada. Lembrem que estou falando de meninas de 9, 10 anos. Nada contra o funk para adultos, mas acho crueldade uma criança em formação ser bombardeada com valores sexistas. Quando a escola decidiu que não teriam funk durante as festas juninas, quase houve uma rebelião...Das mães!
Felizmente, as exceções existiam. A mãe de uma amiguinha de Lia, também casada com um zelador e guerreira ao extremo no que diz respeito a formação cultural da filha (e inteligente o bastante para ter apenas uma filha, de acordo com a renda do casal). Incentiva atividades extra classe, pesquisa, cuida da cultura geral da filha com boa música e estimulando um aprendizado saudável.
Ou seja, não é a origem de uma pessoa ou suas posses que vai determinar o comprometimento da mesma com a educação de sua prole. Mas esses exemplos precisam ser divulgados e estimulados. Espero que um dia sejam o lugar comum.
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